terça-feira, 29 de março de 2011

O mundo está em perigo - by Lucas Lujan

O processo de secularização do mundo está cada vez mais agudo. Um projeto que começou no advento da modernidade, ainda hoje se encontra vivo, a plenos pulmões. O discurso religioso sobre um deus está cada vez menos necessário e cada vez mais rejeitado, e a cada dia milhares de pessoas abandonam a religião no mundo todo. Vivemos uma etapa nova na história, que chamo, copiando o Paulo Brabo, de humanitarismo. Ele consiste em abandonar o discurso religioso, extra-mundano e a-histórico, procurando transformar a história humana por meio de uma práxis solidária, que afirma o respeito mútuo e a boa convivência (comunhão), e tem na compaixão seu sentido mais pleno: seres humanos cuidando de seres humanos, tornando o planeta um lugar bom para se viver. É aqui que reside o grande desafio para nós, viventes do século XXI. Esse processo de secularização humanitária é uma faca de dois gumes. Explico. Alguns, entre eles eu, vêem nesse processo uma segunda kenosis de Deus: a não necessidade do discurso sobre Deus seria um segundo esvaziamento. Em outras palavras, quanto menos se precisa falar sobre Deus, conquanto Ele tenha se tornado parte integrante da nossa convivência cotidiana, melhor. Se o humanitarismo consiste em solidariedade, respeito, comunhão e compaixão, Deus está se tornando prático, não mais uma especulação religiosa. E isso é motivo de celebração e alegria. Porém, alguns vêem nesse processo a demonização de um mundo sem Deus, que precisa ser urgentemente resgatado. Esse é o movimento religioso fundamentalista, presente no mundo todo. Em outras palavras, enquanto o processo de secularização gera libertação em alguns, ele também aprofunda a raiva dos religiosos, e o mundo fica cada vez mais exposto ao fundamentalismo mais radical. Diante do esvaziamento do discurso sobre deus, religiosos do mundo inteiro se articulam para defender seu deus e sua doutrina a todo custo, mesmo que seja tirando a própria vida ou a roubando do outro. Para eles, o discurso religioso sobre deus ainda é muito necessário, afinal, o verdadeiro crente não pode descansar enquanto o mundo inteiro não se ajoelhar. Não é óbvio para todos, dizem os fundamentalistas, que a autoridade religiosa está acima de todas e que aqueles que se recusam a reconhecer isso abrem mão do direito de existir? (palavras de Christopher Hitchens em “Deus não é grande: como a religião envenena tudo”. Rio de Janeiro: Ediouro,2007). O discurso sobre deus é a mais importante ferramenta para os fundamentalistas, porque com ele é possível gerar opressão sem igual. Falar em nome de deus intimida, coloca medo. Falar em nome de deus legitima qualquer atitude, porque é deus que a requer. Logo se vê que falar em nome deus é o melhor negócio para quem quer controlar, cercear a liberdade, manipular, intimidar e legitimar seu próprio poder. É por isso que o discurso religioso é cada vez mais abandonado em nossos dias: porque só faz sentido para os próprios religiosos, e não para o resto da humanidade. Afinal, um deus que está disposto a matar para ser servido só é objeto de adoração dos que tem interesse na matança. E o mundo, liberto do dogmatismo religioso, aprendeu a rejeitar esse deus. A grande ironia é que as religiões, pretensas salvadoras do mundo, estão colocando o mundo em perigo real. Como se não bastassem os genocídios e as guerras históricas legitimadas em nome de deus - entre elas a do Afeganistão e Iraque no governo norte-americano protestante de George W. Bush - desde o último século lidamos com o perigo emergente da guerra nuclear, o que geraria um extermínio em massa. Ou seja, estamos diante de um mundo onde fundamentalistas, em nome de deus, podem acabar com a nossa espécie. Enganam-se os que pensam que há vários tipos de fundamentalismos devido às várias religiões. O fundamentalismo é um novo tipo de religião, atuante nos mais diversos países, que agrega adeptos do culto ao deus da morte, da vingança e do extermínio. O mundo está em perigo. Sonho com um mundo onde falar de Deus seja uma redundância diante da prática do amor solidário e da compaixão, e não com um mundo onde mortes são legitimadas em nome da defesa da fé e de deus. Lucas Lujan

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